Benedito Abbud projetou o Estádio Nacional de Brasília, que conta com uma solução inovadora para o aproveitamento de água da chuva
Em conversa com a Revista Habitare, ele fala mais sobre esse tema, fundamental para o desenvolvimento de projetos que valorizam premissas de sustentabilidade na construção civil, além de outros trabalhos, que buscam resgatar a importância da presença do verde na paisagem urbana e viabilizar o uso racional dos recursos naturais.
Habitare: Como surgiu sua relação com o paisagismo?
Benedito Abbud: No primeiro ano da FAU-USP, comecei a estagiar no escritório de paisagismo do arquiteto Luciano Fiaschi. Nessa fase, descobri um novo universo e suas novas possibilidades. Fiz todo o meu curso de Arquitetura com foco nessa disciplina, tornei-me monitor e depois fiz pós-graduação, mestrado e me tornei professor dessa importante escola.
Meu escritório de arquitetura paisagística conta hoje com aproximadamente 6 mil projetos em praticamente todos os estados do Brasil e alguns em outros países. Esses trabalhos abarcam diferentes escalas, desde o paisagismo residencial até o urbanismo de cidades com a visão do paisagismo. Em 2006, lancei o livro Criando Paisagens, que já vendeu quase 20 mil exemplares.
H: Qual a importância do paisagismo e sua função para os diversos tipos de projetos?
B: Com o crescimento contínuo das cidades, o paisagismo torna-se cada vez mais importante e valorizado. Na década de 80, criamos um novo conceito para os empreendimentos residenciais e vendemos para as incorporadoras a ideia de que o lazer seguro dentro dos condomínios era objeto de desejo dos compradores. Empreendimentos comerciais também começaram a se preocupar com sua aparência e nela incluímos verdadeiros oásis para que o local de trabalho se tornasse diferenciado e mais agradável.
H: Destaque alguns dos principais projetos de sua autoria.
B: Brascan Century Plaza (São Paulo), conhecido como Kinoplex; Parque Jefferson Perez (Manaus); Praça Victor Civita (Praça da Sustentabilidade, em São Paulo); Entorno do novo Estádio Nacional de Brasília; Master Plan da Vila dos Atletas (sede dos atletas para as Olimpíadas do Rio de Janeiro), primeira certificação LEED ND no Brasil.
H: Quando as questões de sustentabilidade começaram a fazer parte dos seus projetos e qual a importância atual dela quando você começa a pensar em um novo projeto?
B: Para mim, a preocupação com a sustentabilidade social veio até antes da ambiental. Sempre acreditei que o paisagismo pudesse melhor qualificar as áreas externas trazendo sombra, ventilação, minimizando a poluição, o ruído para as pessoas. É claro que tudo isso também contribui com o meio ambiente.
Em 2006, preocupado com as enchentes de São Paulo, criei, juntamente com a ABCP (Associação Brasileira de Cimento Portland), os pisos permeáveis para as calçadas, que levam a água das chuvas para a terra, alimentando o lençol freático. Em 2010, criei o Tec Garden para jardins sobre lajes, um sistema que reserva diretamente a água de chuva para irrigar os jardins por capilaridade, sem uso de energia ou bombas.
Tudo isso, somado a muitos projetos com certificação LEED, fez com que ganhássemos o Prêmio Greening de 2013 como escritório sustentável do ano.
H: Como o paisagismo pode ser usado em favor da população nas cidades?
B: A vegetação traz muitos benefícios para as cidades, entre eles, destaco:
- Ameniza a temperatura reduzindo a amplitude térmica;
- Minimiza a poluição e as ilhas de calor;
- Harmoniza a paisagem construída das ruas;
- Traz conforto físico e psicológico, adequando a escala humana aos edifícios;
- Melhora o sombreamento, a ventilação e a brisa;
- Traz cores, aromas, frutas e beleza.
H: Como foi o projeto do novo Estádio Nacional Mané Garrincha, de Brasília?
B: Em parceria com a Fluxus Design Ecológico, elaboramos uma solução que combina sistemas urbanos de drenagem sustentável, integrando elementos como biovaletas e jardins de chuva, ao desenho paisagístico. Aproveitamos para projetar um novo parque esportivo como continuação dos espaços verdes já existentes: Parque da Cidade, o cemitério, Autódromo e a futura ampliação Norte do parque da cidade. Essa mancha horizontal de maciço arbóreo (mais o eixo monumental, vertical, que será revitalizado com um novo projeto paisagístico do escritório Burle Marx), desenhará uma nova cruz verde que reforçará a cruz urbana traçada pelo grande urbanista Lucio Costa.
O projeto tem sido referenciado como um modelo de como implantar 7.000 vagas de veículos, sem impedir que toda gota de água de chuva que caia sobre o terreno seja reutilizada para os sanitários, irrigação, infiltração no lençol freático, tudo contribuindo para minimizar o microclima, extremamente seco, da capital federal.
Foram utilizadas cerca de 5 mil árvores nativas com florações e frutificações diferenciadas, que vai melhor muito a paisagem desse trecho do Eixo Monumental.
H: Qual a importância do LEED e de outras certificações para o meio ambiente?
B: Embora a certificação ambiental seja muito importante e tenha ajudado a melhorar em muito a qualidade dos projetos, não podemos nos esquecer da sustentabilidade social. Sem as pessoas, as cidades não teriam sentido. O novo Plano Diretor de São Paulo, recém-aprovado, vai incentivar a criação de miniparques e áreas de fruição urbana. Recentemente, a Prefeitura paulistana aprovou a lei dos parklets e dos food trucks. Creio que todas essas medidas melhorarão muito a vida do paulistano.